Não valorizamos
suficientemente
a capacidade que
algumas pessoas
desenvolvem para
tocar nas coisas
com leveza.
Abordar um tema
qualquer,
dirigir-se a
outra pessoa ou
responder à
determinada
pergunta são
situações
cotidianas
bastante simples
que nos permitem
distinguir as
pessoas
delicadas. A
delicadeza, não
obstante, pode
realizar-se em
inúmeras outras
dimensões da
existência e,
possivelmente,
constitua uma
espécie de
ângulo pelo qual
se pode ver o
mundo.
Se estou certo,
há formas
delicadas de
compreender o
que nos cerca.
Estas maneiras
pressupõem uma
aproximação
cuidadosa dos
fenômenos de tal
forma que seja
possível fazer
emergir, como
conhecimento,
não apenas
aquilo que se
concebe como
novo, mas aquilo
que se
convencionou
chamar de
surpresa.
Talvez, algo da
delicadeza se
vincule, enfim,
à epistemologia.
Há uma forma
delicada de amar
que deve
pressupor uma
espécie de
"escuta"
radical; vale
dizer: uma
capacidade de
sair de si
mesmo, de
descentramento,
para incorporar
a situação
vivida pelo
outro como um
problema seu. O
amor delicado
funda um
encantamento e,
talvez, possa se
prolongar no
tempo para além
das
circunstâncias
que o
produziram. Há,
seguramente, uma
forma delicada
de viver, de
lutar, de
escrever, de
divertir-se, de
cuidar das
crianças. Há,
também, uma
forma delicada
de morrer. O
ambiente que nos
cerca pode
favorecer essa
disposição ou
impedi-la em
definitivo.
Entre nós - e
possivelmente
mais ainda no RS
- delicadeza é
algo que parece
não informar
algo importante.
Há, por certo,
quem imagine que
a própria
definição de
virilidade deva
excluir a
delicadeza. Para
esses, o
masculino
pressupõe, pelo
contrário, a
rudeza e, não
raro, a
disposição
violenta, a
intolerância e
uma atração
incontornável
pela
vulgaridade.
Penso que essa
tradição seja um
mal e acredito
que a realidade
que nos cerca
poderia ser
muito melhor
caso
valorizássemos a
delicadeza. Digo
isso,
primeiramente,
para mim mesmo.
Muitas vezes,
perdi a chance
de ser delicado
e acredito que,
normalmente, não
o sou o quanto
deveria. Tenho,
felizmente,
conhecido muitas
pessoas
delicadas.
Pensando nelas,
vejo o quanto
devo negar de
mim mesmo. Nesse
caso, para além
da sensibilidade
estética,
falamos de uma
extraordinária
capacidade
teórica que faz
com Muitas
pessoas parecem
ter essa
facilidade e
lembro delas com
frequência. Não
as cito porque
seria uma
indelicadeza com
todas as demais,
mas gostaria de
homenageá-las de
alguma forma,
daí esse texto,
nessa noite fria
em Oxford. A
questão parece
ser: não se
engane, a
delicadeza nunca
é tão somente um
"revestimento" ,
um vazio em si
mesmo. Ela é
sempre a forma
de um conteúdo
compatível.
Oscar Wilde tem
uma frase que
diz, mais ou
menos, o
seguinte:
-"Apenas pessoas
superficiais não
se deixam levar
pelas
aparências".
Penso que ele
tinha razão. A
delicadeza é um
traço da cultura
e sua ausência
costuma
assinalar, tão
somente, a
banalidade ou a
crueldade que
nos foram
deixadas como
herança.
Colaboração:
Cibele Menini
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