Mineirim
em prosa
Maria
Tereza
O
dia em que o conheci,
durante um treinamento
na empresa em que
acabara de ser admitida,
dormi embalada pela voz
dele: calma, mansa,
serena. Lembro-me que eu
tentava segurar o olho,
mas de repente a voz
dele ficava mais sumida,
cada vez mais longe... e
eu dormia.
Algum tempo depois,
fomos trabalhar na mesma
sala, só nossa, só
nós dois, debochando a
vida, brincando todo o
tempo, nem sei como o
serviço saía. Éramos
vizinhos, além de tudo,
e nunca me esquecerei da
sua generosidade ao me
permitir estrear a
jaqueta de couro que
havia acabado de
comprar, novinha,
cheirando ainda a
curtume, para ir a uma
festa country. Nossa
conversa era dita num
código particular, que
ninguém entendia...
mas, se não pudéssemos
falar, aprendemos a
decodificar no olhar o
que o outro queria
dizer.
Ao tempo em que
brincávamos,
procurávamos a
essência da vida,
buscávamos compreender
de onde tínhamos vindo,
para onde iríamos, quem
éramos, realmente. E
viajamos no astral...
encontrei-o no astral.
De muito tempo, muitos
séculos, muitas vidas.
Foi o tempo de me levar
a buscar um caminho novo
aqui e ele foi buscar o
caminho no norte do
Brasil, foi desbravar
Rondônia. Jornalista de
nível internacional,
'de carteirinha', como
ele faz questão de
frisar, faz hoje a
passagem pela pinguela,
rumo ao futuro e cuja
travessia havíamos
ensaiado juntos. Ele me
empurrou e eu consegui,
passei por ela; ele, só
está atravessando
agora.
Ainda que distantes, a
nossa preocupação com
o outro não deixa que
nos esqueçamos. Se
ficamos muito tempo sem
comunicação, é porque
ele não esvazia sua
caixa de mensagens. E
reclama que o tempo é
pouco...
Coisas de mineiro...
manhoso, dengoso, calmo,
navega em águas
plácidas... só corre
na hora sagrada da
cerveja. No mais, parece
que é dono das horas.
E, interessante, elas
passam ao sabor da
vontade dele.
Aprendi com esse moço o
que é conquistar a vida
aos poucos, ter carisma
para angariar a simpatia
de todos, paciência
para lidar com os
momentos difíceis e com
os chatos de plantão e
como vencer a vida,
mesmo aparentando ser
mero espectador.
Sorriso de menino,
tamanho de menino, olhar
matreiro... generoso,
amigo, grande
companheiro na estrada
da vida... Menino que
espreita, espera,
constrói, conquista.
Perto dele, parece que a
vida não tem problemas,
porque consegue ver
otimismo em tudo. Apesar
de levar as coisas a
sério, acho que a nossa
identidade e essa
amizade sem limites, sem
tempo, sem fronteiras se
deu na enorme leveza de
'ir levando'...
Don Pablo, Don Pablito,
Paulo Sérgio, Paulo,
Paulim...
Minas perdeu um mineiro
típico, que migrou de
sua terra para ensinar
ao rondonense o jeito
mineiro de ser, o jeito
Paulim de ser ou, como
ser feliz brincando, de
como se faz para ser, de
verdade, um doce, grande
e leal amigo.
Maria
Tereza
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